Manuela Andrade é uma consultora e formadora com uma experiência vasta em diversas áreas técnicas. Atua como Auditora Coordenadora e Auditora Técnica em vários referenciais normativos, como Codex Alimentarius. Desde 1998 que faz parte da Bolsa de Avaliadores Coordenadores do Instituto Português de Acreditação - IPAC, trabalhando com laboratórios de ensaio, laboratórios de calibração e organismos de certificação de produtos.

Desde 2004 que Manuela integra, a convite de entidades públicas e privadas, Bolsas de Auditores Internos em diversos domínios técnicos e referenciais normativos. Além disso, é responsável pelo Departamento de Formação da MA Consulting e acumula funções como Gestora de Formação no âmbito da certificação pela DGERT.

Veja a entrevista completa: Quem fiscaliza o trabalho da certificadora e qual a periodicidade com que tal é feito?

Manuela: Nós vivemos numa bolha europeia e temos regras próprias, que são os regulamentos comunitários, as diretivas comunitárias, que estabelecem normas em todos os setores da atividade agrícola, não-agrícola, alimentar e não-alimentar, que as entidades públicas e privadas de Portugal e dos outros 26 estados-membros têm de cumprir. Existem matérias comuns aos 27 estados-membros, como é o caso do modo de produção biológico e dos produtos tradicionais, e nós temos de nos enquadrar pelas regras europeias.

As entidades de controlo (certificadoras) devem responder a duas entidades do governo. Uma está ligada ao Ministério da Economia: o Ipac, Instituto Português de Acreditação. E temos depois a Direção-Geral da Agricultura e Desenvolvimento Rural, que é do Ministério da Agricultura e que também, de alguma maneira, gere este setor, sendo a autoridade competente atribuída pela Comissão Europeia nesta matéria da agricultura biológica, dos produtos tradicionais, da produção integrada, etc. Enquanto autoridade competente e vinculada ao Ministério da Agricultura, as suas regras estão emanadas num regulamento geral emitido pela Comissão Europeia. Regras essas que Portugal tem de cumprir, assim como os outros 26 estados-membros.

Paralelamente a isso, temos essa outra entidade cá em Portugal ligada ao Ministério da Economia, que é o Ipac. Por exemplo, temos as empresas, temos as pessoas, temos os produtos. Digamos que gera economia. Contudo, quando queremos comprar no supermercado, por exemplo, uma alface, um tomate, uma compota com selo de certificação, os produtores desses produtos, seja do setor primário, seja do setor de transformação, têm de bater à porta de uma entidade que é um organismo de certificação — neste caso, de produtos — para os certificar.

Em Portugal, assim como no resto dos estados-membros, é obrigatório que estes organismos de certificação de produtos, que certificam essas alfaces, esses tomates e essas compotas, estejam acreditados pelo Ipac, para que seja atribuída a acreditação enquanto organismo de certificação de produtos. Está explícito nos nossos regulamentos unitários que este tipo de atividade, para permanecer no mercado, tem de ser conduzida por organismos de certificação acreditados.

Para uma certificadora funcionar, ela precisa de obter acreditação junto do Ipac? O que é analisado na acreditação para que a certificadora possa atuar?

M: O IPAC atribui acreditação à Ecocert. No entanto, isso não é suficiente. A Ecocert trabalha num plano técnico, portanto, vai ao campo verificar se os produtores estão a produzir de acordo com as regras do regulamento da produção biológica, se as instalações estão organizadas, se as pessoas têm formação, etc.

Além disso, o IPAC também verifica essa parte da agricultura ligada ao Ministério da Agricultura, ou seja, a Direção Geral de Desenvolvimento Rural atribui-nos um reconhecimento. A certificadora deve sempre procurar duas entidades: o IPAC, para obter a acreditação da ISO 17025, e o Ministério, para atribuir o reconhecimento ISO 17065 ao organismo.

Porém, o papel do IPAC está mais focado em analisar e fazer visitas e auditorias técnicas, enquanto ao Ministério cabe mais a parte regulamentar. Essas auditorias são realizadas de tempos em tempos, e o IPAC também faz auditorias ao sistema de gestão para a ISO 1775.

Em 2009, a Comissão Europeia reviu o regulamento de produção biológica e tornou a acreditação obrigatória. As certificadoras tiveram de se adequar e de passar por um processo longo. Precisam de ter um sistema de gestão implementado de acordo com a ISO 17065 e passar por avaliações.

Primeiro, há uma avaliação inicial, feita pelo auditor coordenador, para verificar as instalações, o pessoal, a documentação, entre outros aspetos. Depois, a certificadora deve corrigir as não-conformidades identificadas e enviar um plano de ações corretivas. O prazo máximo entre a primeira e a segunda fase da avaliação é de um ano.

Quanto às não-conformidades mais recorrentes, isso pode variar, mas é comum verificar se as certificadoras cumprem os procedimentos estabelecidos nas normas e regulamentos, bem como se demonstram a competência técnica e os conhecimentos adequados.

O trabalho das entidades certificadoras é dividido em duas vertentes. Elas trabalham no escritório, como acontece com a Ecocert. O escritório é apenas o local de trabalho, enquanto o corpo técnico é composto pelos técnicos de controle, que se deslocam pelo país para auditar as produções agrícolas, ocasionalmente incluindo adegas e unidades de transformação. São os auditores que realizam essas visitas, fazem esse controle e redigem o relatório.

O Ipac, responsável pela acreditação, observa o trabalho das entidades certificadoras tanto no escritório como no campo. Isso desencadeia o que chamamos de "testemunhos da auditoria". Um auditor técnico, geralmente nomeado pelo Ipac, acompanha o trabalho dos técnicos de controle no campo, verificando se eles estão a cumprir as normas de contabilidade. Eles também verificam se o produtor mantém registos adequados. No entanto, o auditor não intervém no processo.

O técnico de controle também tem a tarefa de complementar o relatório com informações detalhadas das listas de verificação complexas. O Ipac realiza a análise inicial no escritório, mas, posteriormente, solicita à Ecocert um plano de controle para os próximos meses. O objetivo é evitar viagens desnecessárias, priorizando os clientes mais próximos à Ecocert.

A pessoa que fez a pergunta mencionou um cliente, uma vinícola, que está a passar pela consultoria da Ecocert. Eles terão uma auditoria do Ipac no próximo mês e receberão um pedido de testemunho da auditoria para acompanhar o seu técnico de controle durante o processo.

A Ecocert certifica muitos produtos diferentes. Para a acreditação, precisa de verificar cada um deles?

M: Para fins de atribuição de acreditação a uma entidade certificadora, considera-se que têm três áreas técnicas distintas: têxtil, modo de produção biológica e produtos nacionais. Cada uma dessas áreas tem diferentes técnicas de controle e clientes, além de regras distintas. O Ipac certamente fará um testemunho em cada uma dessas áreas, ou seja, três testemunhos durante a concessão.

Irão verificar e atribuir a acreditação de acordo com as regras específicas de cada área. Por exemplo, tenho um cliente que é certificado há muitos anos, mas ele também faz certificação de produtos não-alimentares, como produtos artesanais.

Qual é a relevância de transmitir essa informação aos consumidores? Sabemos que é uma parte importante do processo para manter as entidades dentro dos padrões e refletir no mercado. Como poderíamos consciencializar os consumidores acerca de toda essa cadeia de qualidade?

Consciencializar o consumidor sobre toda essa cadeia de qualidade é uma luta que travo há 30 anos. Transmitir-lhes essa informação é difícil, mas podemos realizar constantemente workshops, programas de televisão e, atualmente, temos as redes sociais, onde a divulgação é mais rápida e eficaz.

Porém, como eu disse, é um caminho que temos vindo a percorrer, e as pessoas que entram no supermercado ainda não têm pleno conhecimento.

Precisamos de promover não só a agricultura biológica, mas também a aquisição de produtos certificados. Eu dou preferência a produtos certificados. Se vou a um restaurante e me oferecem o vinho da casa, imediatamente digo que prefiro um vinho certificado.

Hoje em dia, percebo que os espaços dedicados a esses produtos nos supermercados estão maiores e mais visíveis. Antes, eram pequenas prateleiras, mas agora estão mais próximos dos consumidores. Temos de promover essa consciencialização. É uma questão de garantia de qualidade e de segurança para o consumidor.

Acreditação das certificadoras: o que é analisado para que as certificadoras possam atuar?
Voltar às notícias